sexta-feira, 8 de outubro de 2010

Sumo de laranja

Quando a Alice conheceu o João, ele não podia ter a vida amorosa mais enrolada. O João namorava com a Luísa e tinha dado os primeiros passos em direcção à Carla, que trabalhava com ele. Ela era enfermeira e ele médico e calhou terem de trabalhar juntos em casos difíceis. Nos cuidados intensivos, estão sempre a afastar a morte dos corpos doentes e são levados a olharem-se muitas vezes, a fixarem o olhar. Isso estava a acontecer com frequência. E no outro dia, diante do cansaço do João, a Carla atirou uma frase certeira. "O que nos vale é isto. Parece que estamos a contrariar a natureza das coisas". Daí às risadas para descomprimirem foi um passito. Bem, Alice sabia que estava a entrar num filme cheio de histórias cruzadas e mal resolvidas, embora não soubesse exactamente quais no momento, mas ainda assim, não resistiu ao apelo. O que o João tinha que os outros não tinham era uma sinceridade espremida. Falava como se as palavras fossem sumo. Dizia muito bem o que pensava. Era exacto. E ela gostava da forma como ele pensava. Nunca sentiu a namorada como uma ameaça, contou-me ela. E quando o João lhe falou da Carla, passou-lhe pela cabeça que nascesse dali um caso, hum, um caso de batas e lençóis usados em cenário de hospital. E continuou a sair com ele, só para o ouvir e para se ouvir. E continuou a sair com ele. Ficava nervosa antes dos encontros, mas durante era tomada por uma grande tranquidade. Um dia ele disse-lhe: Arrumei tudo, só estou calmo contigo.

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