quarta-feira, 7 de janeiro de 2009

Olho azul

Abri-a bem olho e quanto mais o fazia, mas crescia o seu espanto. O espelho dizia-lhe que tinha um olho azul. Apenas um olho azul. O outro estava igual ao que sempre foi: castanho cor de castanha. Demorou alguns minutos até conseguir encontrar uma explicação. Afinal, no dia anterior tinha dois olhos normais. Tinha dormido sozinha, com lençóis lavados, é certo, a última refeição não incluiu nenhuma iguaria excepcional - voltou a comer queijo fresco com salmão fumado, sobre o qual espremeu um limão. Estaria com o tumor e ver mal por causa disso. Morrer com um cancro na cabeça seria o seu destino? Que fatalidade! Mas isso só acontece aos outros e não a ela, uma pessoa normal, que nunca foi além de uma gripe, curada em três dias. Só podia ser uma doença grave! O que mais podia ser, ia-se perguntando. Quando saiu de casa, perguntou à primeira pessoa, uma velhota que passou: "Desculpe, pode ajudar-me? Repare no meu olho. De que cor é?". Fechou ligeiramente as pálpebras para se fixar bem e respondeu: "Castanho". Atirei logo: "E o outro?". "Azul, é azul", respondeu. "Como pode ser, ontem tinha dois olhos castanhos", disse-lhe. Com ar rezingão, barafustou: "E ainda reclama. Quem me dera ter pelo menos um azul".

1 comentário:

Anónimo disse...

Eu não queria assustar a menina, mas poderá ser uma reencarnação... não? Uma súbita reencarnação? No liceu onde andei havia um cão rafeiro que foi prontamente adoptado pelos miúdos... tinha um olho azul e outro castanho e como tal para sempre ficou o Bowie da nossa adolescência:)...