domingo, 30 de setembro de 2012

desafinado

Alberto era meticuloso no tipo de contacto que estabelecia com amigos novos. Erros do passado fizeram dele um sujeito cauteloso. Quando nos aproximamos muito, arriscamo-nos a descobrir manias estúpidas, falhas graves de carácter, aspectos perversos. Alberto preferia não explorar em demasia certos convívios e evitar chegar a esse ponto. Já tinha o baralho completo. Chegavam-lhe os amigos antigos. Os das suas preocupações. Já lhe davam tantas. No amor, porém, não conseguia travar o processo. Tinha uma curiosidade insaciável. Transportava para os sonhos o possível significado de uma frase atirada para o ar. Enchia-se de felicidade enquanto recordava o olhar deixado à foto da senhora do campo, pendurada no Povo, num segundo, para logo a seguir, questionar as neuroses, os traumas, as incoerências pequenas e grandes, e as mais complexas, as médias. Apaixonava-se pelos deslizes, pelas imperfeições, pelo lado desafinado. Por isso, amava muito mais a Dulce do que o Mário alguma vez gostaria.

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